quinta-feira, junho 07, 2007

lost in translation

Então eu li Budapeste.Eu nunca tinha lido nada do Chico. Sim, é estranho, já que eu faço parte do clube menos exclusivo da face da terra, das mulheres que idolatram o Chico Buarque. Mas eu pensava:não, não é possível, ele não pode ser bom escritor também.
Aí eu me decepcionaria e teria que ser racional em algum momento da discussão de boteco por-que-todas-querem-dar-pra-ele. E também tinha o receio que a associação imediata entre o chico-chico e o chico-autor turvasse minha leitura.
No entanto, minhas preocupações (muuuuuuuuito pertinentes, diga-se de passagem) não me impediram de dar esse pequeno, mas corajoso passo, então eu fui lá e li.
Em primeiro lugar, não, você não fica pensando: hmmm, estou lendo o que O Chico, aquele, escreveu.Pelo menos no meu caso, essa informação prévia foi rapidamente ofuscada pelas desventuras do José Costa, um ghost writer tão cioso do seu anonimato quanto orgulhoso do reconhecimento dos seus escritos, a glória na sombra.
E é a relação do protagonista com a língua que evidencia sua relação consigo, com sua existência. Ele escreve em português vidas que não são a dele, mas a sua vida está ali também. Da mesma forma, a descoberta de um outro idioma é uma descoberta de si, de uma outra forma de estar no mundo.
Aquela coisa dos linguistas, a palavra traduz o mundo, ou melhor, palavras traduzem mundos, os significantes e os significados de Saussure.
Ah, e nada surpreendente, o livro é muito bem escrito.
Aqui o José escreve a autobiografia de um alemão no Rio de Janeiro:

"A escrita me saía espontânea, num ritmo que não era o meu, e foi na batata da perna de Teresa que escrevi as primeiras palavras na língua nativa. No princípio ela até gostou,ficou lisonjeada quando eu lhe disse que estava escrevendo um livro nela. Depois deu para ter ciúme, para recusar seu corpo, disse que eu só a procurava a fim de escrever nela, e o livro já ia pelo sétimo capítulo quando ela me abandonou. Sem ela, perdi o fio do novelo, voltei ao prefácio, meu conhecimento da língua regrediu, pensei até em largar tudo e ir embora para Hamburgo.Passava os dias catatônico diante de uma folha de papel em branco, eu tinha me viciado em Teresa."

Sorry, boys. Ele é bom escritor também.

5 comentários:

Taís Drabik disse...

Olá, Janaína!
Depois do seu post, acho que vou ter que ler o livro do Chico...Talvez seja uma coisa legal para fazer enquanto espero a noite em que ele vai vir fazer uma serenata só para mim, rsrsrs!
Ah! Coloquei um link para o "Quero ser Rita..." no meu blog.
Um abraço!

janaína disse...

e eu espero o dia em que ele vai vir aqui na livraria, hahaha (inclusive eu já tenho uns três modelos de diálogo).
que boa idéia, vou colocar o link do seu blog aqui tb!
beijinho

Taís Drabik disse...

Janaína,

Pode deixar, que quando a pia estiver cheia eu te chamo, rsrsrs!

Anônimo disse...

Quando eu li Budapeste, já vinha de duas más experiências com ele, Estorvo e Benjamin não tinham me agradado de todo, mas Budapeste não, esse caiu macio como uma água no momento de sede, como um corpo cheiroso na hora do desejo. Tem passagens como essa da Teresa que são maravilhosas, sempre que posso indico, mas as mulheres não lêem por esse pré-conceito inicial seu, e os homens não o fazem por inveja. Abraços camaradas...Silvio

janaína disse...

pois é, sílvio, agora que eu descobri que ele também é bom escritor, não restam mais dúvidas: definitivamente, ele é o homem perfeito.
desconfio até que ele não tem remela quando acorda, igual a bailarina, hahaha.
e gracias pela visita!