terça-feira, dezembro 11, 2007

território sentimental

Em Curitiba resolvendo pendengas acadêmicas. Coisas que preciso para ontem (como sempre) e que a minha desorganização (de sempre) transforma num épico o que para a maioria das pessoas seria uma operação relativamente simples. Para ajudar, grandes imprevistos quase inacreditáveis. Uma aventura.
Um monte de gente que eu conheço odeia essa cidade. Eu não. Eu gosto muito da Curitiba que fiz para mim. Por que o lugar é o que você faz dele, não? Experiências pessoais e intransferíveis. As minhas foram muito boas, de um modo geral.
Um dos meus professores perguntou o motivo da minha visita à faculdade e eu brinquei dizendo que o bom filho à casa torna. O que não é tão brincadeira assim. Aqui moram histórias que fizeram diferença, uma espécie de ponto de partida. Academicamente, afetivamente.
Como disse para o Cláudio, não tem como eu não gostar daqui. Foi onde eu comecei a virar gente.

segunda-feira, dezembro 03, 2007

e se puder me manda uma notícia boa

Melhor: mande uma meia de listras coloridas cheia de doces dentro. Foi o que eu acabei de ver enquanto esperava na fila do correio. Sim, esse lugar ainda existe, bem como existe esse hábito pré-histórico de mandar cartas.
Nesse instante não consigo imaginar nada melhor pra receber do mr. postman do que meias com doces dentro.

segunda-feira, novembro 19, 2007

os sentidos dos lugares

As formas produzem sentido. É o que o historiador Roger Chartier descobre nos seus estudos sobre história da leitura. O que ele diz é que as interpretações que um livro pode suscitar não se esgotam no seu conteúdo. Seu suporte físico, por exemplo a edição, o papel utilizado, o tipo de fonte, a existência ou não de ilustrações, são parte fundamental da leitura, e também contêm um universo de significados que se amarram à experiência do leitor, ao mundo social, ao universo simbólico no qual se insere. Uma obra, seja ela qual for, numa edição austera, luxuosa, potencializa outras formas de leitura quando é lançada, por exemplo, em edição de bolso. Outro tipo de papel, outro tipo de capa (curioso é que as capas de pockets freqüentemente trazem chamadas do tipo “ o melhor livro de...”, “o mais vendido ...” – publicidade desnecessária , e até desrespeitosa, nas versões mais elegantes, e conseqüentemente mais caras). O conteúdo é o mesmo, mas a materialidade distinta confere a ele outros sentidos, outros valores.
Lugares são assim também. Penso nisso enquanto estou no melhor deles. O outro céu da Biblioteca Nacional que, como o de gesso das galerias do Cortázar, leva para um mundo diverso, de imponência e art noveau, do tempo em que o Rio queria ser Paris e a Biblioteca queria ser Bibliotèque. Enquanto isso, lá fora, a cidade passeia de havaianas, ora, somos tropicais.
Mas ah, o mundo de dentro. Imagens, sons. Numa espécie de espionagem intelectual investigo o que os outros estão lendo, ali o próprio Chartier, mais adiante Hobsbawm, hoje a História está em alta. Só se pode escrever com lápis, e o silêncio quase total da sala de leitura só é quebrado pelo ruído do grafite no papel, cadernetas, cadernões, folhas avulsas, panfletos, a pena é que lápis não escreve no verso da mão.
E claro, a leitura em um lugar assim é uma experiência completamente diferente daquela feita em casa, ou no parque, ou em outras bibliotecas. Não temos a mesma intimidade que temos com nossos livros, dobrados, rabiscados, domesticados. Mas temos um outro tipo, igualmente sedutor: um objeto que, de tão valioso, nem podemos saber onde fica guardado. E assim mesmo está ali, na sua frente, um tesouro que é seu por algumas horas. Valor de culto, quase a aura de Benjamin.
Mesmo morando aqui faz um tempo, continuo com minha visão exageradamente romântica do que é ler na Biblioteca Nacional. Acho que até por isso poupo um pouco minhas visitas ao lugar: para continuar tendo o gosto de, vez por outra, colocá-la em prática.

sexta-feira, setembro 14, 2007

tudo que é sólido

Para não parecer que eu estou igual às pessoas que trabalham na confeitaria e não aguentam mais ver doces pela frente, sim, ando lendo alguma coisa ( mas é fato - alguns dias eu não consigo nem olhar para os livros, blasfêmia, blasfêmia).
O da vez, comprado praticamente novo em um sebo maravilhoso (blasfêmia, blasfêmia de novo) que descobrimos, eu e Odyr, é Aventuras no marxismo, do Marshall Berman.
Longe de ser o tratado ilegível que a palavra marxismo evoca imediatamente, ao contrário, é quase uma aventura mesmo. A começar pela pela introdução, onde ele conta lindamente os motivos que o levaram a se aproximar de Marx e as descobertas da primeira leitura.
E ele é um grande leitor de Marx. Ao invés da cegueira dogmática que norteou boa parte dos marxistas, ele é muito bem-sucedido em encontrar o equilíbrio necessário entre a teoria e a aplicação dos conceitos, o que de Marx pode ser útil naquilo que interessa a Berman, o entendimento da experiência da modernidade. E muitas coisas fazem sentido, sabe? Inclusive a crítica do jovem Marx a um socialismo irracional que acaba sendo tão opressivo quanto o capitalismo.
Enfim, Marx é Marx para o bem e para o mal, e os prós e contras já foram debatidos à exaustão. Mas são formas de olhar para o mundo, tentativas de entendê-lo. O livro de Berman merece ser lido por trazer a única possibilidade de validade da teoria:quando ela se encontra com a vida.

quarta-feira, setembro 12, 2007

terça-feira, setembro 11, 2007

superegotripmegalomaníacamaisainda

Eu tô me achando.
Por quê, por quê, por quê? Porque esse blog, isso mesmo, esse que vocês estão lendo agora, está em exposição no Oi Futuro. Na mostra Blooks, tribos e letras na rede.
Textos, poemas, quadrinhos, essas coisas, tudo da internet.
Não sei muito bem como chegaram em mim, mas está lá e eu achei o máximo.
Depois posto umas fotos pra vocês compartilharem dos meus delírios de grandeza.

P.S.1: o texto exposto é o 22 coisas...
P.S.2: o Odyr está também, com blog e desenhos. É a nossa mostra conjunta. :)

quinta-feira, setembro 06, 2007

o outro xico

Ali no Todoprosa o Sergio Rodrigues falava esses dias da pesquisa em solo bretão o-que-você-quer-ser-quando-crescer. Escritor.
Tem mesmo muita gente escrevendo por aí ( se até eu, latinoamericana sem dinheiro no banco sem parentes importantes e vinda do interiorrrrrrrrrrrrrr). Ou já escrevia antes, mas agora divulgar ficou tão simples, nem da grana precisa mais, você faz um desses, pressiona seus parentes para garantir o número mínimo de leitores, torce para que os amigos leiam também e voilà. Lá está seu sujeito-verbo-predicado se desmanchando no ar virtual.
Obviamente, muita bobagem. Mas muita coisa boa. Isso tudo para dizer que ando visitando muito o blog do Xico Sá, eu que já o lia quando ele falava da paulicéia desvairada em NoMinimo (oh yeah, sou uma viúva inconsolável).
Mas aqui o tema é outro. O amor e seus demônios. Cantadas, trepadas, traições, pé-na-bunda. Tudo pulsa, tem vida, tem cor. A graça de viver essas experiências, mesmo quando dói. Porque no fim das contas ( que me perdoem os céticos de plantão, mas são anos de filmes de amor) essa é a grande questão, não? Temos nossas preocupações sociais, profissionais, metafísicas ( e ainda bem que perdemos o sono por elas), mas o desejo de ter alguém sempre perpassa a idéia de completude.
É fato que o mundo anda cada vez mais cínico e já decretaram a falência do amor. Tem aquele sociólogo, o Bauman, falando da dificuldade contemporânea de criar e manter vínculos afetivos, lado a lado com o anseio de ter esses mesmos vínculos. Tem o Sex and the city, que, well, sem a roupagem acadêmica e vestindo Oscar de La Renta, fala disso também.
O que eu quero dizer é que acredito piamente que nós precisamos do afeto. Pode ser mais difícil, pode parecer piegas, mas Tom Jobim cantou Wave, e eu acho que é verdade.
E vejam vocês, me perdi por aqui. Só queria falar do blog do Xico Sá. Mas vão lá, ele sim sabe o que diz.

quinta-feira ao sol

Dois minutos olhando para a praia repleta de banhistas estatelados sob o sol. Todas as minhas roupas cheiram a filtro solar. Mesmo assim, ando por dez minutos até chegar ao trabalho e sinto a pele queimando.
O verão faz a festa no falso inverno carioca. Fica fácil entender porque parece que aqui as pessoas são mais contentes. Tendo vista para o mar, a melancolia não funciona muito.
Mas não estou reclamando. Pelo contrário, estou bem perto de me entender de vez com o paraíso tropical.
Só preciso de um filtro solar mais poderoso.

domingo, setembro 02, 2007

nas questões de casal

Não se fala mal da rotina, já dizia o Chico.
Oh, mas se fala. E para mim. Ou na minha frente. E sem querer, ou sem perceber, lá estou eu sabendo de problemas sentimentais que não me dizem respeito.
É quando faço as vezes de versão feminina do garçom. Dia desses um coração partido veio chorar as pitangas para o meu lado. Em aproximadamente uma hora ( ah, a capacidade que alguns têm de falar por horas a fio sem se importar que todas as respostas do interlocutor sejam um balanço de cabeça, ou o variante hum-hum) me contou a história mais velha do mundo, a traição, a desconfiança, a confirmação, o fim.
E como não poderia deixar de ser, desfiou o rosário interminável das suas qualidades, o misto de autoafirmação e autopiedade típico de quem perdeu o chão e custa a entender por quê. E não se iludam, nenhuma semelhança com o rejeitado adorável dos filmes de amor (aquele que a gente não entende como foi descartado - ou entende, a mulher era uma vaca). Não pensem no Luke Wilson ou no John Cusack. Melhor, não pensem mais no assunto, o cara era um saco.
Hoje um casal, que a gente olha e imagina a certidão de casamento amarelando no fundo de uma gaveta. A mulher pára na minha frente atraída por uma dessas coisas que eu nunca sei direito como vêm parar aqui, uma Carteira de Namoro. Como uma adolescente que cola no diário o papel da bala que fulano deu, ela se entusiasma com essas bobagens encantadoras dos primeiros relacionamentos, A declaração universal dos direitos dos namorados, A regra de segurança nos namoros, O contrato de namoro.
Por um segundo, volta no tempo muitos anos e mostra para o marido a página que dizia do direito de ter, por mês, tantos beijos e abraços e cafunés.
Ele, categórico:"a gente não liga para estatísticas".
Num resmungo desgostoso ela responde "é verdade", voltando, imediatamente, para 02 de setembro de 2007.

sexta-feira, agosto 31, 2007

please, mister postman

E agora trabalhamos todos com computadores à nossa frente e ligados à Internet e temos o hábito fatal de checar a caixa de emails de vinte em vinte minutos.
Ora eu me sinto solitária, ora eu me divirto, a Livraria Saraiva me ama, me chama pelo nome e me escreve todo dia. Seguida pela Sony,pela Livraria Cultura, pela Associação Brasileira de Estudos Medievais, pelo Bolsa de Mulher e pela Americanas.com, a melhor loja do mundo também na internet. O Mnemocine esqueceu de mim e o NoMinimo morreu, os dois sites que mantinham o nível da corte virtual e não queriam me vender coisas.
Só o que me conforma é que o "Aumente seu pênis" vai direto para o Spam. Quando eu receber "Olá Janaína, essa é uma chance única para você aumentar seu pênis", aí eu desisto e volto para o modo antigo (quantas vezes eu fui ao correio na vida? Umas cinco, acho).

quinta-feira, agosto 30, 2007

who wants to be a superhero?

Estou vivendo no vácuo deixado pelas séries de amor - terminei de ver Sex and the City, espero ansiosamente o box da 6ª temporada das Gilmore. Então, minha vida televisiva ganha agora personagens não tão românticos, mas nem por isso menos interessantes.
Finalmente Twin Peaks. Riam do meu atraso, folks, mas quando a série foi ao ar eu tinha 11 anos, meu pai nunca deixaria eu ficar em frente à tv até tão tarde para ver na globo (aos 11, eu mal sabia da existência da tv a cabo). Novo Herói nº1: Agente Cooper.
O médico mais cínico do mundo com uma capacidade detetivesca para diagnosticar doenças misteriosas. Novo Herói nº2: House.
Eeeeeeeeeeeeee...Heroes!Todos são ótimos. Mas claro, eu tenho um preferido. Novo Herói nº3: Hiro, o supernerd japonês.
Como vocês podem ver, minha vida está a salvo até as garotas voltarem.

anotações contentes pra quando a tpm vai embora. ou dá uma trégua.

Manhã nublada com superheróis, música e afeto.
A vida é boa.

quarta-feira, agosto 29, 2007

É isso que está me faltando.

anotações rabugentas para os dias de tpm

(ou, como eu não ando com vontade de escrever porra nenhuma, encho isso aqui de bobagens ainda maiores do que quando estou com vontade).

Na próxima encarnação quero nascer borboleta. Direto, sem a porra da lagarta porque eu não quero aprender porra de lição de moral nenhuma que a lagarta feia vira borboleta bonita.
Eu quero ser uma borboleta falante que só sabe falar porra.
Porra, porra, porra.

terça-feira, agosto 28, 2007

alma de baleia, espírito de porco

Ando sem ganas de escrever e com muitas delas para falar mal de quem. Mas eu não resisto, com o livro que eu recebi hoje: "Exorcize sua alma gorda". Mens magra in corpore magro. Só é gordo quem quer, que nada. Só é gordo quem tem alma gorda.
A proposta do livro é essa: identificar o glutão transcedental que existe em você e eliminá-lo. Alma manequim 38, já no próximo verão.
E para quem pensou que esse post não poderia ficar mais pobre, um bom e velho clichê: o primeiro passo para resolver um problema é reconhecê-lo.
Descubram, então, se sua alma está acima do peso:

Alma magra:
-refere-se a uma macarronada como carboidratos;
-pimentão, tomate e cebola=saborosa salada;
-tem olho proporcional a sua "não-barriga";
-sua ídola é a manequim Twiggy dos anos 1960.

Alma gorda:
-refere-se com prazer a uma macarronada como pasta ou macarronada mesmo;
-pimentão, tomate e cebola=molho do cachorro-quente;
-tem o olho maior que a barriga (avantajada, diga-se de passagem);
-sua ídola são todas as modelos da fase renascentista.

Agora chega, senão eu vou ter que levar a minha alma (gorda, por supuesto) para vomitar.

quinta-feira, agosto 23, 2007

superegotripmegalomaníaca

Eu casei com o artista. Então agora eu sou assim.

quarta-feira, agosto 22, 2007

o retorno do historiador

Por enquanto é só uma idéia. Uma conversa. Uma possibilidade.
A gente busca tanto o sentido, quer saber para que serve, quer saber o que sabe. E sabe pouco, sempre. E sabe ser inquieto, oh, sim, há tantas opções, às vezes tudo parece possível, às vezes parece tão difícil. Escolhas, escolhas.
Odyr me diz que todo mundo nasce para alguma coisa. Não sei ainda para quê, eu. Mas pensar em papéis velhos, lembrar do cheiro, da textura, dos tesouros escondidos numa revista antiga me trouxe, se não a resposta mágica definitiva, a memória de uma sensação acolhedora. Um pertencimento, um clube que me aceita como sócia.
A ver.

quinta-feira, agosto 16, 2007

rápida e em tempo real

Cliente velhinha e eu com uma dor de estômago de matar:" vi um livro com uma capa linda que parece que é muito bom. Você sabe qual é?"

quarta-feira, agosto 08, 2007

o retorno de marley

Nos dias de bom humor, a chegada de caixas de livros é sempre uma alegria, parece natal antes do tempo (nos dias de mau humor, resmungos mais-coisas-para-cadastrar). Hoje é um dia do primeiro tipo, e coincidentemente chegaram muitos livros na Dona Laura.
Antes de abrir as caixas, uma olhada rápida na nota fiscal, para saber o tamanho do meu contentamento. E lá estava, entre "O Livro de Ouro da Psicanálise" e "Os deuses e o amor" (como a mitologia explica e orienta nossas escolhas e relacionamentos), um livro chamado Orson. Na hora eu pensei: yes, uma biografia do Orson Welles e mais um livro para a minha prateleira preferida, a de cinema.
Ledo engano. Orson é "um cachorro para toda a vida", "louco, trapalhão e inesquecível - um amigo de verdade". O comentário do autor de "Marley e eu" (na capa):"Jon Katz compreende os cães como poucos e desvenda a alma canina com delicadeza e sabedoria".
Fala sério.
Na faculdade, eu tinha um professor que dizia nunca assistir filmes com os três C - câncer, criança e cachorro - por conta da alta concentração de tristeza apelativa dos mesmos. Esse tipo de livro segue o mesmo princípio, suponho. Não sei se tem uma criança com câncer que é dona do cachorro, ou uma criança que tem um cachorro com câncer, ou um cachorro que pensa que é uma criança com câncer. Pelo jeito é o relato de um homem e seu cão que mostrou para ele as coisas importantes da vida e morreu no final. Não, eu não li nem a primeira página, mas não é preciso ser o José Mindlin para descobrir como essa história acaba.
E bueno, acho que vocês me entendem, a implicância não é com o cachorro, not at all. Cães são o máximo. Mas convenhamos. Primeiro o Marley, depois os três da Abigail ("Harry, Rosie e Carolina irão preencher o vazio da cama e aquecê-la nas noites gélidas"), depois o Christopher (um porco - e mais uma vez o comentário do dono do Marley na capa: "algumas vezes precisamos de um porquinho esperto para nos mostrar o que realmente importa na vida" - há). Tempos atrás li sobre um leilão milionário entre editoras americanas pelos direitos de publicação da história de um gato mascote de uma biblioteca.
E agora o Orson.
O Rocco, meu labrador, ficou no interior profundo e eu tenho saudades dele. Acho que vou escrever um livro sobre isso e ficar milionária.
"Meu caso de amor com Rocco começou numa gélida manhã de julho, quando, pela primeira vez, meus olhos perceberam aquela bola branca de pelos frágil e desamparada, e não tive dúvidas em trazê-lo comigo. Mal sabia eu que a partir daquele dia minha vida nunca mais seria a mesma".


P.S.:E por falar em oportunismo, Orson foi para a vitrine. Ah, o vil metal.

terça-feira, agosto 07, 2007

a segunda-feira clássica

O filme inteiro é maravilhoso, mas uma das situações que eu mais gosto em Annie Hall é a da brincadeira na cozinha com a lagosta, vivida por Annie e Alvy, que depois tenta inutilmente reproduzi-la com outra mulher. É aquela história: cada relacionamento tem sua lógica própria, suas piadas próprias, suas neuroses próprias, absolutamente intransferíveis. E suas próprias tradições.
Uma das nossas, há pouco instituída, é a segunda-feira clássica: noite com comidinhas, vinho se o tempo permitir e um good and old classic movie.
A proposta foi aceita de bom grado por ambos, mas nem tudo são flores na vida do casal, e surge o grande dilema: a escolha do filme. Porque uma outra característica da nossa relação é a disputa, ora velada, ora explícita, pelo controle do controle remoto. Como diz o Odyr, nos tópicos tv e música os dois querem ser o macho alfa.
Ontem, depois de duas videolocadoras, muitos debates e exaustos de tanto ler sinopses de filmes, fomos vencidos pelo cansaço e seduzidos pelo pop. Ok, um desses diversão garantida. O eleito foi Kung-fusão, na hora eu pensei, well, o nome não convence, mas pra quem virou fã do Gafanhoto, que seja.
Misture num mesmo filme referências tão díspares como kung fu, romances obscuros de Hong Kong da década de 40,gângsteres, O iluminado, Papa-léguas e Fred Astaire ( e outras mais). Funciona. Num minuto você está vendo uma cena digna dos melhores filmes de artes marciais e no minuto seguinte você tem a impressão de assistir a um desenho animado, e tudo embalado por uma trilha sonora surpreendente. Escrito, dirigido e estrelado pela mesma pessoa, no caso, o chinaman Stephen Chow.
O mais provável é que Kung-Fusão não fique para a posteridade e continue espremido na estante filmes-de-ação entre os outros blockbusters. Mas para a gente, ele mereceu a segunda-feira.

quarta-feira, agosto 01, 2007

protelar é viver

Atire o primeiro relatório quem nunca trocou uma obrigação iminente pela primeira desimportância que apareceu na frente.
Lembro dos trabalhos chatos da faculdade - ok, um artigo para o mês que vem, tenho muito tempo para ficar olhando as pontas do meu cabelo. Começo a escrever amanhã. Mas amanhã tem Curtindo a vida adoidado pela octogésima vez na sessão da tarde e é claro que eu assisto para perceber nuances que passaram batido nas outras 79.
No outro dia tem cinema, no outro tem boteco, no outro tem compras e por aí vai.
Véspera, então. Agora é sentar na frente do computador, estalar os dedos, ter todos os livros de apoio por perto, comidinhas, água e café. Mas são só seis da tarde, se eu começar às sete até meia-noite eu termino. Ainda posso jogar uma partida de paciência (houve uma época que eu tomei uma atitude drástica e deletei paciência do computador. Viciei em pinball).
E o resto é fácil: um jogo de paciência viram cinco, a comida acaba e você decide que precisa cozinhar alguma coisa que vai te tomar pelo menos uma hora, acidentalmente você liga a tv e descobre um documentário interessantíssimo sobre o processo de descaroçamento de algodão, você tem a brilhante idéia de provar todas as suas roupas para ver o que não quer mais. E seis da tarde viram sete da noite que viram meia-noite e seu artigo é escrito numa madrugada em claro. Seguido pelo comentário autocrítico e autopiedoso eu-nunca-mais-vou-fazer-isso. Como naquela historinha em que o Calvin precisava entregar um trabalho escolar e dizia para o Hobbes que não adiantava tentar fazer nada antes de ser tomado pela inspiração suprema: o pânico do último minuto.
Tenho estantes para arrumar mas me dei conta de que já faz muito tempo que eu não escrevo nada aqui.
Algumas coisas não mudam.

domingo, julho 15, 2007

domingueira

Lembro de um desenho animado, da Disney, acho, em que o personagem descobria a música do mundo:a gota de chuva pingando na folha, os passos de alguém apressado, a manchete na boca do vendedor de jornais, uma garrafa sendo aberta, isso não é um ruído, reinvenção do cachimbo de Magritte.
Domingo tem música também. A música ruidosa dos feirantes a uma quadra de casa. Do passeio na coleira dos cães de estimação. Do passeio anárquico dos cães de rua. Dos motores dos únicos dois carros parados no semáforo da Nossa Senhora de Copacabana.
Hoje é domingo, pede cachimbo. Ou pé de cachimbo? Quem disse que as frases do versinho precisam fazer sentido? Não as crianças.
Música em casa, Yo la tengo com espanhol no nome, músicas espanholas com nomes mexicanos. Música na minha cabeça, Velvet Underground com Sunday morning.
O Rio canta o jingle das Casas Pernambucanas para o frio que bate à porta e o inverno carioca não conhece casaco ou cachecol (da minha janela vejo uma árvore perdendo folhas e respiro aliviada, outono, pelo menos).
É inverno e não faz frio, é domingo e eu trabalho. Em algum lugar por aí deve haver uma canção que diz que a vida da gente não obedece ao protocolo.

domingo, julho 08, 2007

o amor nos tempos do orkut

Em Fragmentos do discuro amoroso, Barthes reserva um verbete para um elemento fundamental no imaginário romântico: as cartas de amor. Por que o desejo, compulsivo às vezes, de escrever para a pessoa amada, mesmo quando os temas esgotam e resultam numa mesma idéia, repetida quase que em cada linha, e mesmo assim não há cansaço nem em quem escreve nem em quem lê?
E Goethe responde:Porque recorri novamente à escritura? Não é preciso, querida, fazer pergunta tão evidente.Porque, na verdade, nada tenho para te dizer;entretanto tuas mãos queridas receberão este papel.
Então vem a imagem da espera ansiosa pelo carteiro, a comoção em reconhecer uma caligrafia, a carta lida e relida e beijada e guardada debaixo do travesseiro. Imagem tão alheia à nossa realidade, criaturas do mundo hi-tech, mal lembramos que o correio existe.
Mas oh, o amor encontrou uma via, como sempre encontra. E descobrimos o email romântico. Perdemos a angústia/delícia da espera, o frio na barriga ao identificar o remetente, mas ganhamos em praticidade. Nossa letra uniforme times new roman viaja pelo espaço virtual e chega agora mesmo ao destinatário.
Há um ano exatamente um email inaugurou uma sequência de postagens cujo resultado não é novidade para vocês.E hoje estou aqui, sorrindo enquanto digito. Não preciso mais de emails pra amenizar a saudade, mas eu os releio de tempos em tempos. Sou do tipo que acredita que algumas coisas resistem às nossas modernidades e cyberexperiências. Coisas do romantismo de antigamente, como a alegria da carta recebida, lida e relida e beijada e guardada debaixo do travesseiro.

sábado, julho 07, 2007

duas entradas, por favor

E vejam vocês como são as coisas. Se ontem mesmo eu reclamava que não vou mais ao cinema, porque o trabalho, porque o horário, isso e aquilo, ontem mesmo eu fui. Um arranjo com a Tati, que também trabalha aqui, e pronto. Lá fomos, eu e o Odyr, na incrível e inusitada aventura de sair de casa na sexta-feira à noite.
E a gente não foi num cinema qualquer. Não, a gente foi no enorme, lindo e glamouroso Roxy. É um daqueles cinemões de rua, letreiro gigante em vermelho, escadaria imponente, o hall iluminado por um lustre que desconhece a modéstia e desdenha da conta de luz.
E a sala, claro, o carpete e as cortinas e a tela grandiosa que é a constatação tão óbvia, tão lúcida de que nem a melhor televisão, nem de plasma e na parede, pode reproduzir o encantamento de ver as coisas com lentes de aumento, de acreditar, por um segundo, que o trem vai sair da tela na sua direção.
O Roxy é do tempo em que ir ao cinema era um grande acontecimento, aquelas duas horas mágicas em que o mundo é de sonho e cabe numa tela, com direito a pipoca e mãos dadas e beijos clandestinos entre uma cena e outra.
Ainda bem que vez por outra a gente pode ser desse tempo.

A propósito, fomos ver Ratatouille. Paris, gastronomia e considerações sobre o ofício do crítico. É sensacional.

sexta-feira, julho 06, 2007

o demônio e a srta. jana

O Paulo Coelho é o novo funcionário da casa de cultura. O universo conspirou pra que ele usasse um uniforme com o nome do cinema bordado na camisa, e agora, ao invés do caminho de Santiago, ele guia as pessoas até os filmes.
Meu desejo de fazer o looooongo e demorado e cansativo caminho místico-religioso-novo-sentido-à-vida do livro do mago é inexistente. Mas fico verde de vontade de fazer a mini-peregrinação até a sala de projeção( uns dez passos mais ou menos).
Há séculos não vou ao cinema, eu e meus horários bandidos e minha única folga na semana, dia de ficar em casa.
E enquanto trabalho o demônio faz pirraça e anuncia uma mostra com filmes de Orson Welles e Fellini e Buñuel, de graça e bem ali a dez passos.
A mim me resta olhar, do balcão, os contentes indo e vindo atrás do bruxo, enquanto Borges, imortalizado num ímã aqui na minha frente, diz que o paraíso é uma espécie de livraria.

segunda-feira, junho 11, 2007

a classe operária vai ao paraíso

Mãos ao alto, teje preso, temos provas. Ok, eu me rendo. Eu fui à praia. Sim, sim. Tudo como manda o protocolo: dia de folga no Rio, praia, elementar-meu-caro-Watson. E fui com o Odyr, tão pouco habituado às lides praianas quanto eu.
Sabe quando a gente vê aqueles filmes de época onde as mulheres vão à praia de vestido, salto e sombrinha e acha que nada pode ser menos apropriado? Minha existência na areia de Copacabana, mesmo com trajes apropriados (leia-se biquíni que nunca tinha saído da gaveta)me pareceu tão alienígena quanto.
E é tão impressionante, você olha pra frente e vê o mar, vira o rosto e vê a rua com engarrafamento, isso que é tão comum aqui no Rio, a natureza e a civilização andam sempre misturadas, quando você pensa que nada pode ser mais urbano o ônibus passa por um túnel no meio da montanha. E é por isso que eu gosto do Rio.
Mas eu fui, vi e venci. Passada uma meia hora eu já estava quase confortável. Depois de uns 45 minutos eu entrei na água e molhei até o joelho. Na próxima eu entro de verdade. E mais umas vinte vezes eu troco o fator 30 pelo 8.
Vou ser praticamente uma carioca.

quinta-feira, junho 07, 2007

lost in translation

Então eu li Budapeste.Eu nunca tinha lido nada do Chico. Sim, é estranho, já que eu faço parte do clube menos exclusivo da face da terra, das mulheres que idolatram o Chico Buarque. Mas eu pensava:não, não é possível, ele não pode ser bom escritor também.
Aí eu me decepcionaria e teria que ser racional em algum momento da discussão de boteco por-que-todas-querem-dar-pra-ele. E também tinha o receio que a associação imediata entre o chico-chico e o chico-autor turvasse minha leitura.
No entanto, minhas preocupações (muuuuuuuuito pertinentes, diga-se de passagem) não me impediram de dar esse pequeno, mas corajoso passo, então eu fui lá e li.
Em primeiro lugar, não, você não fica pensando: hmmm, estou lendo o que O Chico, aquele, escreveu.Pelo menos no meu caso, essa informação prévia foi rapidamente ofuscada pelas desventuras do José Costa, um ghost writer tão cioso do seu anonimato quanto orgulhoso do reconhecimento dos seus escritos, a glória na sombra.
E é a relação do protagonista com a língua que evidencia sua relação consigo, com sua existência. Ele escreve em português vidas que não são a dele, mas a sua vida está ali também. Da mesma forma, a descoberta de um outro idioma é uma descoberta de si, de uma outra forma de estar no mundo.
Aquela coisa dos linguistas, a palavra traduz o mundo, ou melhor, palavras traduzem mundos, os significantes e os significados de Saussure.
Ah, e nada surpreendente, o livro é muito bem escrito.
Aqui o José escreve a autobiografia de um alemão no Rio de Janeiro:

"A escrita me saía espontânea, num ritmo que não era o meu, e foi na batata da perna de Teresa que escrevi as primeiras palavras na língua nativa. No princípio ela até gostou,ficou lisonjeada quando eu lhe disse que estava escrevendo um livro nela. Depois deu para ter ciúme, para recusar seu corpo, disse que eu só a procurava a fim de escrever nela, e o livro já ia pelo sétimo capítulo quando ela me abandonou. Sem ela, perdi o fio do novelo, voltei ao prefácio, meu conhecimento da língua regrediu, pensei até em largar tudo e ir embora para Hamburgo.Passava os dias catatônico diante de uma folha de papel em branco, eu tinha me viciado em Teresa."

Sorry, boys. Ele é bom escritor também.

quarta-feira, maio 16, 2007

coisas para fazer quando não há nada para fazer

A livraria está em obras e minha função hoje é supervisionar. Olhar, com zero de interesse, homens quebrando paredes. Vão instalar um ar-condicionado bem em cima da minha cabeça e vai ser sempre inverno na dona laura. O que me deixa bem feliz porque roupas de inverno são muito mais bonitas mesmo, e eu enlouqueci folheando a editoria de moda da tpm com os casaquetos (nome besta, peças incríveis, como eles mesmo dizem) e vontade de comprar vários agora que o trabalho vai possibilitar usar casacos quentinhos e descolados. Isso foi o que eu fiz hoje. Li toda a TPM. Li a matéria sobre a Andrea que aos 42 anos é uma superpoderosa produtora da O2 e tive tempo de ter uma crise instantânea porque eu já tenho quase 30 e já fui pesquisadora, revisora de jornal, estagiária de um dia numa agência publicitária, professora e agora balconista e não tenho muito claro o que eu quero ser nos próximos 30 anos.
Li também sobre os filhos da puta - literalmente - as pessoas cujas mães fazem programa. E claro, eles têm relações de mãe-e-filho como qualquer um, elas se preocupam com os horários, eles não admitem que as ofendam, e enfim, as regularidades no irregular. E um texto lindo da Milly Lacombe que sempre escreve textos lindos.
Eu li o jornal também e fiquei sabendo que o Paulo Coelho apareceu na novela das seis. O mago tá com tudo: perfil de muitas páginas na New Yorker, artigo celebrado na Folha de São Paulo, e agora global. Pra ele, pelo menos, a máxima "quando você quer alguma coisa o universo todo conspira pra que se realize", funciona. A propósito, abro aqui uma brecha para um momento deslumbre caipira na capitar: o Isaac Bardavid, o Zequinha da novela, vai todo dia me falar oi na livraria - tem uma peça dele em cartaz na casa. Eu ainda vou pra Globo.
Já fiz um monte de palavras cruzadas também. O Millôr disse que jogar xadrez é muito útil pra aumentar a capacidade de jogar xadrez ( ou alguma coisa assim). Fazer palavras cruzadas é muito útil pra aumentar a capacidade de fazer palavras cruzadas.
Já vasculhei o orkut de um monte de gente, já vi meu email, já fui no boteco, já escrevi essas bobagens e ainda tem um monte de tempo até a hora de ir pra casa.
Lá, lá, lá. Já se foram mais dez segundos.
Tchu-ru-ru. Mais dez.
Quais, quais, quais, quais, quais, quais,quais (é assim que escreve, aquele som que eles repetem indefinidamente em "Trem das Onze"? - Há, há! acabei de achar uma versão:Faz, faz, faz faz faz faz, faz carinho dumdum,
Faz carinho dumdum, faz carim dumdum. Não posso ficar...).
Ok, isso me custou uns trinta segundos.
Não está funcionando.
Vou ter que achar outra coisa.

mi casa, su casa

Adiós, Santa Teresa.
Não mais o charme dos casarões, das ladeiras impossíveis, do bonde-de-são-januário-leva-mais-um-operário-sou-eu-que-vou-trabalhar. Au revoir, cidade do interior a quinze minutos do centro. Igreja com pracinha e boteco onde te conhecem.Hasta la vista, hippies (well, essa parte é boa).
Trocar o bairro decadente (e elegante) dos primeiros arrivistas pela sedução fácil da praia, o mundo das pessoas de sunga que frequentam a areia e a padaria com a mesma naturalidade.
É isso. Está feito e acabou chorare. Sai Santa Teresa, entra Copacabana. A praticidade venceu a poesia. Quinze minutos (a pé) do meu trabalho. Uhhh. Perto do trabalho do Odyr, também.
E justiça seja feita, não é de todo mal estar a uma quadra da praia. Meus olhos de revistas de magreza enxergam caminhadas matutinas e quilos a menos e pele mais bonita e mais disposição e água-de-coco que é bom e não engorda.
A dona de casa que eu não sou se alegra com o supermercado na esquina e a farmácia e todas essas coisas que é bom de ter por perto, ainda mais nos dias de hoje em que o tempo é tão curto e tantas coisas pra fazer e todas essas baboseiras do discurso da vida moderna.
Say goodbye, say hello. Hora de encaixotar as coisas, dizer tchau pra Santa, oi pra Copacabana. Mas a gente volta um dia.

quarta-feira, abril 25, 2007

allez le bleu

Ok, o cinza é horrível. De volta, então.

terça-feira, abril 24, 2007

fase cinza

Resolvi seguir a sugestão do tio blogger - crie um visual completamente novo para seu blog- porque aquele azul estava me enjoando. Ah, eu não gosto muito desse aqui também.

domingo, abril 22, 2007

sweet home II

Eu não vejo tv. Não porque isso seja uma forma de protesto contra a alienação ou o emburrecimento ou qualquer desses motivos panfletários que as pessoas usam para justificar sua aversão à ela. Eu adoro a caixa mágica. Verdade que eu adoro muito mais se quando eu ligo eu tenho à disposição cento e tantos canais dos quais eu só vou ver três ou quatro e que nunca, em nenhum, vai passar algo que preste num dia em que a única coisa que eu quero é ficar jogada no sofá olhando para imagens em movimento. Mas que fique registrado: sou totalmente a favor da tv (tv a cabo, tv a cabo!).
Eu não vejo tv porque na minha casa não pega. Isso me traz alguns problemas. Informação de menos. É evidente que eu fico sabendo a quantas anda o mundo por outros veículos, mas enfim. O que não me interessa me passa; isso é mais difícil de acontecer com a tv, principalmente quando são megaeventos que ela fica anunciando infinitamente na nossa cabeça até parecer que não sobra espaço pra outra coisa.
Por que escrevo isso? Porque ontem o Rio de Janeiro praticamente parou por conta de um sei-lá-o-quê aéreo em Botafogo( o que vocês obviamente sabem porque não são extraterrestres como eu). Muita, muita, muita gente. E a esperta aqui foi trabalhar como se fosse um dia qualquer. Claro que o ônibus não se movia. Claro que o metrô estava impraticável. E a histeria das pessoas. A vendedora de bilhetes do metrô berrando que não tinha troco, as mães cansadas com os filhos no colo, as pessoas exaustas de tanto esperar alguma forma de transporte. Um esforço olímpico pra se divertir. Maratona. Ok, ok, cada um é cada um (ou cada um milhão) como já dizia o outro, mas aquilo nem de longe me pareceu diversão.
Como termina a história? Depois de duas tentativas fracassadas achei um caminho alternativo, e cheguei ao trabalho uma hora e meia atrasada. E fiquei pensando que, em certos dias, a coisa mais divertida a se fazer é ficar em casa.

quinta-feira, abril 19, 2007

fiat lux

O que faz de um livro um grande livro?
São muitos critérios, não? Literários, obviamente. Mas políticos também. Mercadológicos. E até de compadrio. Ou alguém entende exatamente quais os méritos que levam um escritor ao panteão da imortalidade da nossa ABL? E o que dizer do último ganhador do Pulitzer que também está na lista do clube de leitura da Oprah?
Qualquer classificação tem uma parcela grande de subjetividade, interesses envolvidos, trocas. Nem sempre a gente entende e nem sempre a gente concorda. Ainda mais quando se trata de uma experiência tão íntima quanto a leitura. Por isso que lançamos ao mar a garrafa com o deus - ou deuses- das palavras, parafraseando o García Marquez, e fazemos nossas próprias listas de livros.
A minha acaba de ganhar mais um título: Tudo se ilumina, do Jonathan Safran Foer. Estou totalmente encantada, e olha que ainda nem terminei. É lindo, é engraçado, é triste, é poético. Às vezes o que eu estou lendo é tão bonito que eu não sei nem o que fazer, releio o parágrafo, tenho vontade de sair mostrando para as pessoas, como ele teve aquela idéia, e como conseguiu escrevê-la tão inacreditavelmente bem, como aquilo me tocou tanto. O tipo de livro que mesmo quando você não está lendo, as imagens estão lá, brincando na sua cabeça, e você não vê a hora de se encontrar com ele de novo.
Desses livros que fazem diferença. Por muitos motivos. E quando eu leio o jornal e me desespero com a avalanche de desgraças anunciando o fracasso da espécie, penso que ainda se escrevem coisas assim e que, no fim das contas, a humanidade não está de todo perdida.

Ah, claro. Essa maravilha da literatura contemporânea está a venda na livraria Dona Laura. O melhor atendimento com o preço normal. E a logomarca mais linda do mundo.

sexta-feira, abril 06, 2007

22 coisas que é preciso saber para trabalhar em uma livraria

1-você fica feliz de estar cercada por livros que poderá ler quando não tiver clientes;
2-você fica deprimida de estar cercada por livros porque descobre que leu muito menos do que deveria;
3-você se desespera porque quer ler muitos livros e acha que nunca vai ter tempo pra tanto;
4- às vezes você só tem vontade de ler as bobagens;
5-às vezes você só tem vontade de ler os difíceis;
6-você se sente privilegiada porque pode ler qualquer coisa que está lá;
7-você descobre que livros, além de maravilhosos, são muito pesados - principalmente quando você tem que conferir, cadastrar e colocar na prateleira 25 caixas deles em dois dias;
8-você tem que ter paciência porque clientes velhinhos querem te contar todo tipo de história;
9-você tem que ter paciência porque clientes madames ricas acham que qualquer pessoa atrás de um balcão é invariavelmente estúpida;
10 - você se diverte muito porque livrarias são frequentadas por gente inteligente;
11- você se diverte muito porque livrarias são frequentadas por todo tipo de maluco;
12- você fica orgulhosa porque sabe falar dos livros que você gosta e que estão ali pra vender;
13-você fica orgulhosa quando os clientes se impressionam porque você sabe do que está falando e acabam se interessando por livros que você acha que valem a pena;
14- você tem que fingir que leu o caçador de pipas, marley e eu, o livreiro de cabul e os outros todos da lista da veja (e agradece aos céus pelos sites de resenha);
15-você aprende a mentir com propriedade e elenca qualidades improváveis num livro que você acha uma porcaria;
16-você aprende a fingir interesse quando o cliente te conta a maravilha que é o livro tal do paulo coelho que mudou a vida dele e por isso ele está levando o outro;
17-você fica com vontade de dizer que não vale a pena comprar livros estúpidos;
18-você quer mais é que comprem todo tipo de estupidez porque você ganha comissão;
19-você fica bem feliz quando compram livros legais;
20-você se sente perdida quando te pedem pra indicar um "livro bom" pra dar de presente e não te dão a menor pista do que o presenteado gosta de ler;
21-você se irrita com o fato de ter que trabalhar nos fins de semana e nos feriados;
22-você se alegra porque, em um mês de trabalho, leu 3 romances (finos, vá lá), 7 livros de humor, alguns ábuns de quadrinhos, 2 artigos teóricos, e ainda folheou todos aqueles livros lindos e carésimos que provavelmente você nunca compraria porque só servem pra enfeitar a mesinha da sala e impressionar a visita.

terça-feira, abril 03, 2007

a vida ao rés-do-chão

É o (lindo) título do (lindo) artigo do Antonio Cândido sobre a crônica. Essa forma "menor" da literatura, a prima pobre. Que não tem grandes pretensões, que não se propõe a nenhum tratado sobre o mal-estar da civilização ocidental, que se contenta em ser um olhar sobre o corriqueiro. Um bilhete para uma viagem breve, assim, com o café da manhã. O Antonio Cândido diz que é como o jornal (que via de regra é seu suporte), tem vida efêmera, não mais que um dia. E que, mesmo mínima, pode ser grande.
Às vezes penso nesse artigo enquanto venho para o trabalho. Porque eu tenho o similar visual, instantâneos que meu olho captura entre as paradas do ônibus.Gentes. Tanta coisa acontecendo. Uma mulher com peitos que não cabiam na blusa e sua amiga que não tinha peito nenhum. Um homem que levava uma cadeira nas costas. Logo ali uma ruiva de verdade, que parecia muito triste e usava muita maquiagem. Palavras nas camisetas (alguém vestia uma que anunciava um ateliê de biojóias - o conceito me escapa totalmente), palavras nas propagandas dos carros (um uno oferecia os serviços de dedetização, descupinização e desratização), o gringo-óbvio-camarão-camisa-de-turista.
Amanhã serão outras pessoas, em outras novelinhas. Novos personagens para as minhas crônicas não escritas. Minha vida ao rés-do-chão.

sexta-feira, março 23, 2007

terezinha

Dia curiosamente deprimido hoje, que o Odyr diz que é muito natural porque estou em fase de adaptação. O que me alivia é que o Nicolas Cage ficou infinitamente mais deprimido no filme.
Mas no ônibus um moço cantava Terezinha, suponho que ensaiando para alguma apresentação no fim do dia, porque eu ouvi umas cinco vezes. A estudante do lado dele estava achando um tédio e ficou feliz quando chegou a hora de descer, ela no seu uniforme muito Nelson Rodrigues (leia-se saia plissada, camisa, meia branca e sapatinho), a materialização da fantasia clássica masculina da colegial. Só que ela tinha uma pena colorida na orelha, essas coisas equivocadas. Uma colegial rodrigueana com um quê de hippie, então. Há que se adaptar as fantasias.
E eu ri sozinha porque lembrei do Didi vestido de Betânia na também cláááááááássica dramatização dessa música. Uma das cenas antológicas da tv brasileira (sim, essa frase poderia ter saído da boca do faustão logo depois dele dizer "um dos monstros sagrados da tv brasileira". Blergh).
É, não se pode ficar muito tempo triste se no ônibus pessoas te fazem lembrar os trapalhões.
Ainda bem.

terça-feira, março 13, 2007

sweet home

I'm back. Rapidamente, só pra dizer que estou viva. Vida nova , casa nova, trabalho novo, muitas coisas acontecendo. Muito pouco tempo para contar.
Mas aí vai um minimicroresumo da minha saga por essas bandas.Meu trabalho é em uma livraria. À minha frente, a praia de Ipanema. Nada mal, huh?
Um longo, longo, longo caminho desde o novo teto até o emprego de onde se pode ver o mar. Mas eu preciso dizer que ainda tenho acessos súbitos de encantamento dentro do ônibus, basta olhar para fora e o pão de açúcar está lá e eu não torço o nariz nem boto banca de blasé eu-vejo-isso-todo-dia. Não ainda. Eu sorrio, isso sim. Uma alegria discreta, uma pequena comemoração diária. Eu sei que é tão clichê, mas não há como negar: o Rio continua sendo.
E quando volto pra casa eu tenho quem eu quero e então fico tão feliz quanto se pode ficar.
Sim, amigos, o mundo anda me tratando bem. Eu me dou as boas-vindas.
E beijo meu Rio de Janeiro.

segunda-feira, fevereiro 26, 2007

por uma vida menos ordinária

O som de ir embora. Outra vez. Passagem de ida nas mãos. As malas quase prontas, um esforço gigantesco para levar, por ora, o necessário. Ainda é tanto. E uma bagagem imaterial maior e mais importante. Os que vão sempre comigo. Mais amigos ocupando o espaço invisível do meu afeto. Mãe, irmãs, essa coisa complicada que é família, fúria e doçura.
Querer ficar tão perto, senti-los em mim, um estoque da presença para quando a saudade chegar. Mas não me levem a mal. Não quero parecer melancólica. Essas agruras também compõem o processo.
E para dizer a verdade, fora essa parte que sim, dói um pouco, tudo corre leve. Não me vejo aflita, nem assustada, nem nada assim. Claro, há um grau de indeterminação aí, uma chance de as coisas não saírem como planejadas. Mas viver nunca é algo muito exato, n'est pas? A gente escolhe e torce para dar certo. E é tão bom acreditar nessa possibilidade.
Acho que é por isso que estou tranquila, tudo me soa tão simples. E ao mesmo tempo é tão grande. É como ensina o tio Cortázar, o fantástico irrompe no cotidiano. E na maior parte do tempo não é anunciado em neon, não vem com fogos de artifício ou matéria no jornal. Está por aí, mostrando que viver é pra se encantar. A vida é cheia de tesouros escondidos, de mapas para as Índias, de visões de paraísos. Eu vou lá procurar o meu.

sábado, fevereiro 17, 2007

vai passar II

Pensamento do dia: não fale mal do carnaval que deus castiga. Ou o coisa ruim, já que carnaval é festa pagã.
Estou com uma gripe horrorosa. A cabeça dói, tudo trancado, meu nariz está igual ao do bozo e não consigo comer nada. Bom, pelo menos isso é legal, por dois motivos: quem não come emagrece ( eu contra todas as regras nutricionais para atingir o peso ideal ) e não preciso cozinhar, o que evita a sequência funesta de frustração porque a comida ficou uma droga, bagunça na cozinha, louça para lavar e mau humor resmunguento não- foi-pra-isso-que-as-feministas-queimaram-sutiãs ( eu e meu entendimento torto do movimento feminista).
E hoje tenho festa para ir e estou com uma cara péssima, mas vou mesmo assim porque quero usar meu vestido lindo e novo. Eu sei, estou num momento de contenção de despesas, e não vou comprar mais nada. Mas palavras como "promoção", "sale", "50% off", têm sobre mim o mesmo efeito hipnótico de "madagascar", no Escorpião de Jade ( a fatura do cartão de crédito faz as vezes de "constantinopla").
E de qualquer maneira, meu vestido, além de lindo e barato, é totalmente versátil: com algumas adequações se adapta a várias situações, e vou poder usá-lo inclusive no inverno. Ou seja, comprá-lo foi praticamente uma medida de economia (sim, estou descaradamente tentando expurgar meu sentimento de culpa).
Dura, gripada, sozinha, com casa para arrumar ( mas estou doente e não posso fazer esforço). Eis como eu pulo o segundo dia de folia.

sexta-feira, fevereiro 16, 2007

vai passar

Mas então.O que eu estava contando no post que o vento levou é que eu vejo duas coisas positivas no carnaval: as músicas do Chico sobre o tema e não precisar trabalhar. Essa última, no meu caso, é providencial, porque acho que não há nada mais desanimador do que ter que cumprir obrigações em um lugar quando já se está com a cabeça em outro.
E devido à minha curtíssima lista de coisas-legais-sobre-o-carnaval, estava imaginando uma programação alternativa para os dias de folia.
Pensei em dividi-los em unidades de tempo, como o Will, de Um grande garoto. Muitas serão consumidas em filmes e seriados ( e a tv a cabo vale cada centavo investido, agora mais do que nunca).
Arrumar as roupas no armário por ordem de cor e de frequência de uso - tarefa inédita e totalmente inútil, daqui a pouco elas vão mudar de estado. Mas de qualquer forma, são várias unidades de tempo.
Separar os livros por assunto e organizá-los em ordem alfabética. Outras tantas unidades.
Hidratar o cabelo, fazer as unhas, limpeza de pele, boteco com os amigos igualmente não-carnavalescos, baixar músicas da internet para o meu tocador, umas coisas para ler e voilá: dias simplesmente lotados.
É assim que eu vou pular o carnaval.
(E se essa bagaça sumir de novo, só falo sobre isso em fevereiro de 2008).

ué?

cadê meu post de carnaval?
sumiu?
pfff.

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

smallville

Viver no interior pode ser tão cansativo. A minha mudança.
Os amigos, a quem eu queria contar e de quem queria o parecer, estão informados há tempos.
Então pronto? Não mesmo.
Todo santo dia isso é assunto. O amigo do amigo, o amigo do amigo do amigo, o amigo da mãe, o desavisado que me viu umas duas vezes na vida, as pessoas do trabalho, as mulheres que frequentam o salão de beleza, os alunos, os ex-alunos. E lá vou eu pela milésima vez contar tudo. Mais olhos arregalados. Mais adeptos à lista dos contra ou a favor. No começo foi até divertido, mas agora estou enjoada.
Me sinto um pouco como o Julian Po, do filme de mesmo nome. Ele chega numa cidadezinha e declara que vai se matar. Crônica de uma morte anunciada. Aquilo vira o acontecimento, e a cidade inteira o segue para ver se ele vai mesmo.
Obviamente, não virei o acontecimento da cidade, e não vou ter platéia na rodoviária para conferir se eu vou mesmo.Mas de todo modo, isso cansou.
Então, um pedido: torçam para que algo de surpreendente aconteça por aqui. Tipo encontrarem um fóssil no quintal de alguém.
Algo que renda conversa pelo menos até eu ir embora.
Porque eu não falo mais.
Fim de papo.

quinta-feira, fevereiro 08, 2007

só de olhar para ela

Almodóvar, em De salto alto, conta pra gente como é difícil viver à sombra dos pais. O jogo duplo entre a admiração profunda e o temor de não conseguir corresponder às expectativas que - supõe-se - pairam vigilantes sobre o filho de uma lenda.
E se fosse o filho do Gabriel García Márquez? Rodrigo García é, e parece que não se intimidou. Hoje vi Coisas que você pode dizer só de olhar para ela, que ele dirigiu.
Que já valeria algo só por esse título, lindo. Mas é mais que isso. Cinco mulheres e suas histórias entrelaçadas. Eu sei, nos dias que correm, quase torcemos o nariz para mais-um-filme-de-narrativas-fragmentadas-que-se-cruzam-em-algum-ponto, de tão recorrente que se tornou esse recurso. (Ah, eu ainda não assisti Babel, mas acredito que o Iñarritú tem algo mais pra dizer além dessa construção que é sua marca característica. A ver.)
Mas a beleza de Coisas... está em cada trajetória, e principalmente na maneira como é contada. Uma delicadeza. A médica que cuida da mãe doente quase de vidro, e atende ao telefone ansiosa e nunca é quem ela espera. O perfume no elevador que diz para a moça cega que ela foi ignorada. A dor de uma relação que, se sabe, em breve será interrompida, porque uma delas tem aids.
Histórias que terminam para começar em outro lugar.
Porque, como diz um dos personagens, todo mundo procura alguém. Que nos faça sentir vontade de falar coisas só de olhar. E que nos faça dizer outras sem precisar de palavras.

terça-feira, fevereiro 06, 2007

mas é só isso?

Meu amigo Cláudio colocou o link desse blog no dele, e deu a descrição mais legal do mundo: "blog da jana 100% menina". Eu amei!
E aproveitando o ensejo, tomei vergonha na cara e fui descobrir como faz para editar os links. Que ridículo eu não saber. Tão simples, e eu com preguiça de ler a ajuda. Dã.
Mas finalmente aprendi. E agora o Cláudio está aqui. E o Odyr. E a Jackie. E minha cara no flickr.
E amigos desblogados: façam um blog que eu coloco o link aqui também!

quinta-feira, fevereiro 01, 2007

quinta-feira, 20h

No filme A vida em preto e branco, o personagem principal é assíduo espectador de um seriado dos anos 50 que é a perfeita tradução do american way of life. E por uma operação mágica do seu controle remoto, ele e a irmã são transportados para dentro da tv, e passam a fazer parte daqueles episódios que antes só viviam na fantasia. E a transformá-los. Lindo, lindo.
Se eu tivesse um controle remoto desse, escolheria passar um tempo em Stars Hollow, a cidade das garotas Gilmore. Que é o lugar dos sonhos. Cheio de personagens deliciosos e situações idem. Como uma maratona de dança (quando Dean, o primeiro e perfeito namorado da Rory, termina com ela por causa do Jess, o desajustado lindo e lido), ou a maratona de tricô (episódio de hoje).
Sei que Lost é que está na moda, ainda mais agora com o Santoro e tudo, e eu me curvo à voz da razão espectadora.
Só que não adianta. Lorelai e Rory estão no topo da minha lista com quilômetros de vantagem de qualquer outra série, com ou sem ilha. Sei de cor todas as temporadas, não atendo telefone e imponho o toque de silêncio na sala quando estou assistindo.
Mas também, pudera. Tudo o que elas são e vivem é absolutamente fabuloso. Lindas e totalmente bem vestidas. Rory é incrivelmente inteligente e incrivelmente doce. Lorelai tem um senso de humor inacreditável. Elas compram cereal matinal colorido, só comem porcaria e não engordam, assistem a filmes clássicos ( e que coisa mais querida o episódio em que o Christopher levou a Lorelai para ver Cinderela em Paris), têm bom gosto musical e os diálogos mais ágeis de todo Connecticut.
E são sensíveis mas são fortes, e sempre estão às voltas com problemas amorosos, e são mãe e filha e melhores amigas.
E sim, eu queria ser a Rita Hayworth. Mas não acharia ruim se pudesse ser uma garota Gilmore.

quarta-feira, janeiro 31, 2007

mundo de ponta-cabeça

Dizem que a desgraça nunca vem desacompanhada. Sempre vem junto duas ou três ou quatro mais.
Acho que com as mudanças passa a mesma coisa. Nunca é uma só. Não entendo nada de astrologia e não sei em que era estamos, não sei qual é o significado de 2007 (2+0+0+7) na numerologia, nem se está escrito em alguma estrela, nos búzios ou no tarô que esse é o ano da grande transformação. Mas no meu universo pretensamente cético elas estão vindo como uma avalanche.
Tudo muda por aqui.
Por uma linda história, vou mudar de emprego, de cidade, vou mudar basicamente tudo o que ando acostumada a chamar de minha vida. E estou tão, tão feliz.
Minhas irmãs também experimentam vida nova. Amanhã vai a Isa. Mais uns dias e vai a Bê. E minha mãe não quer ficar vazia numa casa tão grande e está em busca de outro teto.
Agora há pouco minha relação com meu pai mudou, ainda que momentaneamente. Morreu seu melhor amigo, e eu o vi chorando. E tive vontade de abraçá-lo. E pela primeira vez em muito tempo não foi o abraço diplomático de aniversário ou das festas de final de ano. Tão surpreendente, para mim, senti-lo humano, senti-lo vulnerável, e querer fazer algo para que ele ficasse melhor.
Claro que nossa relação, que nunca foi grande coisa, não vai ter uma reviravolta sentimental dessas dos filmes depois disso. E tudo bem, nos habituamos a conviver com nosso estranhamento. Mas de qualquer forma, é curioso perceber que algumas circunstâncias despertam sentimentos amarelados, que quase esquecemos que existem.
Sim, o grande deus Mu dança. Não acredito muito que isso tenha a ver com os astros ou com Plutão que não é mais planeta, mas mesmo assim vou lá fora dar uma olhada nas estrelas.

sexta-feira, janeiro 26, 2007

rayuela

Mas o amor, essa palavra...

segunda-feira, janeiro 22, 2007

jana in Ri-o-o!

Uma semana de Rio de Janeiro. Não fui à praia, nem ao Corcovado, nem ao Pão de Açúcar. Acenei pra Copacana duas vezes. Pra minha alegria e infelicidade de todos os outros turistas, não faz sol, é agradável andar pelas ruas. Vou ao cinema, ao boteco, à videolocadora, leio.
Sim, eu sei. Sou a turista mais fajuta do mundo de todos os tempos. Praticamente não saio de Santa Teresa.
Mas quer saber?
No momento, pra mim esse é o melhor lugar no mundo.

sexta-feira, janeiro 12, 2007

flying down to Rio

Foi o que fizeram Fred Astaire e Ginger Rogers em 1933. A primeira vez que a dupla apareceu dançando na tela, e o primeiro filme importante dele. Aquela coisa, mostrar o Brasil para os gringos.
Mais tarde, à época da Segunda Guerra, essa aproximação se estreitou, graças ao esforço (político e cultural) norte-americano de unir as Américas contra o inimigo bélico, as terríveis forças do Eixo. Quando Walt Disney criou o Zé Carioca, e fez aqueles filmes Alô amigos, e Você já foi à Bahia?
O começo desse último parece uma aula sobre a fauna e a flora brasileiras. Meio chato. Ainda assim eu gosto. Até pensei em passar para os alunos para explicar a política da boa vizinhança, mas suspeito que seria linchada (ah, juventude!). Então me contentei em fazer uma breve imitação da Carmem Miranda. A melhor idéia, já que fui ovacionada por uma platéia entusiasmadíssima.
Mas enfim. O Pato Donald também foi ao Rio.
Orson Welles voou para o Rio ( e para o Ceará) em 1942, para fazer o documentário É tudo verdade. Que acabou sendo abandonado, para ser remontado postumamente, em 1993.
Até a Rita voou para o Rio. Tempos atrás vi uma foto dela no carnaval carioca.
Eu já comprei minha camisa florida e meu chapéu cata-ovo e vou também. Pena que não sou moviestar, então vou de ônibus mesmo.
Na volta eu conto.

quarta-feira, janeiro 10, 2007

bebadosamba

Tarde chuvosa em casa, revirando cds, acabei por encontrar o Bebadosamba do Paulinho da Viola. E sei que Mara e Cláudio vão me xingar de fake porque me apresentaram ao melhor do rock'n'roll e eu fico falando de samba.
Mas não tenho culpa. O Paulinho da Viola é finíssimo. Letras e músicas lindas. E ele canta lindamente.
Memórias Conjugais é um maxixe bem-humorado, e é uma graça. Aí há também uma explicação acadêmico-afetiva, eu diria. Maxixe me lembra os primeiros anos do século XX, uma das épocas que mais gosto. A belle époque tropical, como o livro do Jeffrey Needell.
Nossa elite afrancesada. Os intelectuais discutindo nos cafés as novíssimas idéias sobre política, sociedade, cultura, progresso, todas vindas da Europa. Reformas urbanas para acompanhar as mudanças, principalmente na capital. Sim, o Rio civiliza-se!
Não é à toa que gosto tanto da praça Marechal Floriano, no Rio. Lá estão a Biblioteca Nacional (um dos meus lugares preferidos no mundo), O Museu Nacional de Belas Artes, o Theatro Municipal. Todos prédios daquele tempo, ladeando a Avenida Central (hoje avenida Rio Branco), o boulevard tupiniquim.
Mais pra lá fica a Colombo. As vezes que fui me fizeram pensar que tinha voltado ao começo do século passado. Quando os letrados tomavam café e falavam coisas importantes. E os ricos escolhiam seus pratos nos menus em francês.
Mas enquanto o topo da sociedade carioca cultivava o desejo de ser estrangeiro, as festas populares eram animadas por um novo tipo de dança, uma mistura de vários ritmos. Segundo o Mário de Andrade, a primeira dança genuinamente brasileira. Era o maxixe. Que foi apresentado na Europa e mais tarde conquistou os nacionais que antes torciam o nariz.
Maxixe, então.

Memórias conjugais - Paulinho da Viola
Lapidar
Foi a sua frase
Proferida de um jeito natural
Registrei esta preciosidade
Sem alarde
No meu livro de memórias conjugais
-“Tenho asas, meu amor, preciso abri-las
Ao seu lado não sou muito criativa”
Depois dessa
Fui em busca do meu antidepressivo
E afundei
No sofá com meus jornais
Minha cara no espelho já diz tudo
Desconfio de um carma secular
Pelo jeito, eu também sou um embrulho
Mas eu juro, deste muro
Amanhã vou me jogar
Resolvi
Vou tomar um providência
Pra começar, lá no bar do seu José
Para ver
Se exorcizo este domingo – céu nublado
E esta mala
Que não larga do meu pé

segunda-feira, janeiro 08, 2007

time is money

Ou dinheiro é tempo. Muito tempo. Uma tarde inteira. Ontem foi o dia de resolver pendengas financeiras. Filas, esperas.
Coisas para se fazer nas férias.
Primeiro, bom humor, afinal de contas tinha o dia livre, dentro do banco tem ar condicionado e estava com meu tocador de música a tiracolo. Tudo bem, a gente espera. Uma, duas, três, quatro, cinco músicas. Lá,lá,lá.
Uma gerente bonita e sorridente. Por isso as pessoas devem ficar tanto tempo na mesa dela. Ok, nada de se irritar.
Mais músicas. Enjoei. Ah, exposição de fotos. Vi todas. Duas palavras com um ex-aluno. Conversa com uma amiga. Mais alunos. Aceno ao meu vizinho que usa Grecin 2000 e óculos ambervision na testa. Mais duas palavras com um colega.
E fim do bom humor. Palavrões mentais. A gerente não era mais bonita e sorridente. Era devagar. Muito devagar.
E ainda tive que ir pra fila. Ui, como demora. Por que só três caixas? Por que todo mundo resolveu vir justo hoje? Por que se enrolam tanto pra tirar a carteira do bolso? Por que aquela mulher está conversando com o caixa? Por que aquela maldita bobina sempre acaba justo na minha vez? Por que eu não nasci herdeira?
Um dia inteiro de ócio irremediavelmente perdido.
Suspiro.

quarta-feira, janeiro 03, 2007

elementar, meu caro

Não sou grande leitora de romances policiais. Tampouco sei se é a categoria exata para enquadrar esses livros que vez por outra me caem nas mãos.
Oh, definições.
Uma vez um contista (agora não me lembro quem, mas deve ser um desses bem óbvios), a despeito das teorizações acadêmicas sobre essa forma literária - narrativa, em prosa, menor extensão, etc, etc, etc. -, disse que um conto é aquilo que o autor quer que seja. Eu diria que o que entendo por literatura policial é aquilo que a prateleira da livraria quer que seja.
Crimes. Suspeitos. Pistas. Detetives. Tive uma fase totalmente Sherlock Holmes. Também acompanhei as investigações do comissário Maigret, do Simenon. E para não deixar de lado a prata da casa, me diverti um bocado com o Ed Mort, que divide o escritório (escri, na verdade) com baratas e um rato.
No livro Cuca fundida, de Woody Allen, um detetive é contratado para encontrar Deus. Muito bom.
Por esses dias, ando às voltas com "Tiros na noite", do Dashiell Hammett. Que eu conhecia por nome, já que criou Samuel Spade, que é o Humphrey Bogart, que encontrou o falcão maltês.
E é uma delícia. Não traz a atmosfera elegante que emoldura os crimes europeus investigados por Holmes e Maigret, mas cidades norte-americanas plenas de violência, cinismo, corrupção. Os Estados Unidos noir. Cenário que me fascina há tempos no cinema, e agora me encanta na literatura.
Sim, Hammett está sendo boa companhia. Ele e seu Spade, que aparece em três contos. Tão distinto, fisicamente, do Spade de Hollywood.
A propósito, adoro a frase de Bogart-Spade no fim de Relíquia Macabra (como foi traduzido o título do filme para o Brasil). Perguntam-lhe por que o falcão maltês é tão valioso, ao que ele responde, shakespeareanamente: esta é a matéria da qual os sonhos são feitos.
Que é a mesma matéria que faz a literatura. O cinema. E me faz a vida real mais leve sobre os ombros.

terça-feira, janeiro 02, 2007

então que venha

Pronto, passou. O massacre das festas em família. As trinta mil vezes que tive que desejar feliz natal e ano novo, já que não sou anti-social e não quero azedar a vida de ninguém.
Não comi 12 uvas (acho que essa é a quantia), não comi lentilhas, não pulei ondas, não beijei na boca. Mas tudo correu muy bien. E 2007 começou com chuva, eu que gosto tanto.
E começa bem em muitos aspectos.
Então que venha.
Estou aqui.