sábado, dezembro 30, 2006

tempo de violência

Não, não há como ficar incólume. Ligo o computador e está lá, a sequência de fotos do enforcamento de Saddam.
Não que eu não quisesse saber. Não que eu não precisasse saber. Nem saberia dizer ao certo se foi a melhor forma, se eu preferia que fosse eletrocutado, ou tomasse um daqueles soros letais, ou qualquer outra forma de matar alguém que foi muito, muito, muito absurdamente cruel durante toda a vida. Não saberia dizer se eu acharia melhor uma outra alternativa, porque, no fim das contas, ele fez o que fez.
Não, não tenho pena de Saddam.
Mas eu fico perplexa com isso tudo. A Lei de Talião em tempos modernos. O espetáculo de horrores acessível a todos, comemorado no mundo todo, afinal-a-justiça-foi-feita. Ou vingança. Celebraram o homem na forca, não o fim dos problemas no país. Que, obviamente, continuam.
Mas para Bush o episódio de hoje foi um "marco importante no rumo seguido pelo Iraque para se transformar numa democracia capaz de se governar, sustentar e defender, além de ser aliada na guerra contra o terrorismo".
Democracia que, segundo ele, vêm sendo conquistada graças aos esforços e sacrifícios de seus soldados. Democracia sob o jugo do império norte-americano. E nem preciso dizer aqui das desumanidades cometidas pelos EUA desde a intervenção no Iraque.
Isso é terror também, não?
Mas enfim. Não tenho intenção e nem poderia fazer uma análise político- econômico-sociológica da morte do ditador. Os especialistas todos vão falar disso com propriedade.
E eu vou ver e ler e ouvir e continuar atônita.

quarta-feira, dezembro 27, 2006

paris é aqui

Os afetos que a convivência traz. Perto de casa tem uma locadora e vou quase todos os dias. Se não pelos filmes, ao menos para um oi aos meninos que trabalham lá.
Isso é tão interior, conhecer o dono da padaria, do supermercado, da banca. E principalmente, saber que todos te conhecem. Eu me incomodei muitíssimo com isso, desde que voltei. Hoje me importo menos. E algumas coisas acabam sendo bacanas.
Como a locadora. Ontem, depois que fechou, eu e os meninos ficamos lá dentro, comendo pizza e assistindo De volta para o futuro, falando o tempo todo o que aconteceria no segundo seguinte.
É divertido assistir a filmes dentro da própria locadora. Pode-se ter qualquer um. Escolhemos uma bobagem delícia, já que a intenção não era se concentrar, mas integrar o filme à nossa reunião maluca de comida no balcão, cartazes por todo lado, sentados no chão, rodeados de dvds.
E o programa se estendeu a uma mesa de bar.Com piadas contadas uma atrás da outra. Impressionante o talento que alguns têm para isso. Eu sou um fiasco. Mas mesmo assim me deixaram contar as duas únicas que eu sei, uma delas não mais (Mara, Cláudio, Helder, Vanessa: eu não sei mais a piada da lógica!), até riram para que eu ficasse contente.
Tecnicamente, eu não gosto de rodas de piada, eu nunca acho tanta graça, nem tenho tanta paciência. Mas foi bom e diferente e eu ri junto com eles.
Uma vez eu li algo assim: Não espere para ser feliz em Paris.
E está certo, não?
Já que ando por aqui, vou tratando de ser feliz como posso. Vivendo coisas que são bonitas em qualquer lugar. Uma mesa com amigos, sem nenhuma pretensão além de ter uma boa noite de terça-feira.

Ah, a piada que eu sei.
Um estudioso dos malefícios do álcool para o organismo vai dar uma palestra nos Alcóolicos Anônimos. Coloca sobre a mesa dois copos, um com pinga e um com água, e um verme em cada copo. O que está no de água se estapeia, sofre um pouco, mas chega até a borda e sobrevive. O que ficou no de pinga se estapeia, se revira e morre dentro do copo.
Aí o palestrante pergunta: e então, gente, o que vocês aprenderam com isso?
Um lá do fundo ergue a mão: A gente não tem verme.

Pode rir, agora.

domingo, dezembro 24, 2006

véspera

Domingo e véspera. Dia duplamente ocioso, esforços em dobro para fazê-lo significar.
Nem se quiséssemos seria um dia normal.
Nem se muçulmanos.
O meu faz sentido em estar com os meus jogada na sala, tv, colchões no chão, pipoca para todo lado.
E então é um lindo dia.
Por isso eu fui à locadora e paguei o filme com moedas de chocolate.

sexta-feira, dezembro 22, 2006

unhas flamejantes

O que a Reese Witherspoon faz quando fica deprimida, em Legalmente Loira?
Vai à manicure.
Não adianta. Definitivamente, esse clima natalino me deixa meio down. Pra me animar, fui fazer as unhas, e pela terceira ou quarta vez em 27 anos pintei de vermelho. Vermelho não. Ameixa. Primeiro é esquisito: parece que tem um monte de insetos vermelhos (vermelhos não, ameixa) em volta de mim. Depois é esquisito de novo porque minhas mãos ficam ainda mais brancas. Depois é o máximo.
Eu adoro essas bobagens do universo feminino. Fazer as unhas, mexer no cabelo, usar cinco mil creminhos, um para cada coisa, cada um com um princípio ativo diferente, todos tão coloridos e cheirosos.
Na universidade eu trabalhei com uma revista feminina das décadas de 30, 40 e 50. E já naqueles anos a indústria cosmética fazia milagres pelas damas. Com a diferença de que um produto só dava conta de quase tudo.
A pomada Calêndula Completa prometia amaciar a pele, tirar sardas e manchas, fazer desaparecer rugas, panos, asperezas, ulcerações, combater a supuração da pele, inflamações e erupções eczematozas. A loção perfumada Pichurim evitava caspa, seborréia, queda. E ainda fazia os cabelos brancos voltarem à cor natural.
E o melhor de todos, a Pasta Russa: "Torne seu busto mais firme. Mais jovem. Conserva e dá aos seios firmeza, perfeição e encantamento. Garantia absoluta, comprovada em famosos institutos de beleza".
Beleza em potes.
Acho que é por isso que elas eram tão lindas.
Hoje os produtos são mais específicos e algo (oh, pobre crédula) mais realistas. Salvo aqueles miraculosos da Polishop, claro. O chá que te emagrece dormindo. O gel que acaba com a celulite. Aquela cinta louca. Diz que diminui dois manequins, mas as mulheres não devem conseguir respirar dentro daquilo. Um espartilho moderno, só que horroroso.Céus.
Esses, obviamente, não se pode levar a sério.
Mas existem tantos, e tão bons.
Uma vez me perguntaram de quantos cremes uma mulher precisa.
Todos.

terça-feira, dezembro 19, 2006

all about christmas

Eu bem queria um texto sisudo, grave, denso, pra justificar porque eu não gosto do natal. Mas meus motivos são tão bobos. Eu e minhas amenidades.
O grande motivo não é o oportunismo capitalista. Logo quem.
Não é pelas pessoas que doam brinquedos mas abominam as políticas públicas de redução da desigualdade. Dizem que não servem, que são estímulo à vagabundagem. Como se fosse simples gerar emprego pra todo mundo, como se fosse aceitável se conformar com subempregos. Então fazem crianças felizes um dia no ano e regozijam-se da própria benevolência e dormem tranquilamente o sono do status quo inalterado. Com isso eu me incomodo o ano todo.
Não é pelos dramas familiares. Como se fossem novidade.
O meu não gostar do natal é tão menor que isso.
Eu sempre estava longe.
Eu sempre estava ferrada.
Tinha peso nos ombros.
Terminando trabalhos em cima da hora, porque é assim que eu funciono.
E enquanto eu virava a madrugada enlouquecida, pela janela Curitiba iluminada.
E hoje eu não tenho um trabalho com o prazo estourado.
E mesmo estando bem,
e dormindo o que devia.
Cada luz dessa acesa,
cada melodia,
me dão uma pontada.
E eu acho tão esquisito.
Sentir tristeza recente
por algo que já passou.

domingo, dezembro 17, 2006

happy again

Mulheres de tpm, uni-vos! Vamos reviver o movimento feminista, queimar nossos sutiãs, exigir tpm para ambos os sexos.
Não, não vamos queimar nossos sutiãs. Eles estão cada dia mais caros, não? Mas atire o primeiro gloss cor de boca a mulher que nunca praguejou o fato de que só a gente vive esses dois, três dias terríveis que antecedem a menstruação, ser-homem-é-tão-fácil. Ah, hormônios, ah, útero, ah, ovários. E o que me deixa mais irritada é que não tenho intenção de fazer uso da dádiva (duvidosa) de poder ser mãe. Eu penso que já tem bastante gente por aí. Se bem que dizem que aos trinta todas enlouquecem querendo ter filhos, coisas do relógio biológico e tals. Ainda assim tenho dois anos e meio para reclamar.
Ah, oui. Estive deprimidíssima. Nem dois filmes com Tom Cruise resolveram. Deveria ter tentado o Harrison Ford, meu herói-mor.
Tratamento de choque em technicolor, então. Cantando na chuva, pela milésima vez. Acho que nenhum filme me deixa mais feliz. Ok, também me alegro com todos do Fred Astaire, que parece um grilo dançante, e mesmo assim consegue ficar com a Rita, com a Audrey Hepburn, com a Cyd Charisse. A Ginger Rogers eu acho meio sem-graça.
Mas tudo em Cantando na chuva é muito bom. A começar pelo enredo, sobre os atropelos dos grandes estúdios de Hollywood com a entrada do cinema falado, graças à ousadia da Warner ao lançar O cantor de Jazz. E na verdade eram só duas cenas, 354 palavras ouvidas. Mas foi o suficiente para se transformar em um sucesso absoluto, a despeito dos puristas e dos pessimistas de plantão que achavam que aquilo nunca iria dar certo. Foi em 1927.
25 anos depois, Cantando na Chuva brinca com isso, e o resultado é maravilhoso. O filme todo é delícia. Os lindos números musicais. A parte metalinguística, ao falar do próprio cinema, da veneração dos astros e estrelas, das revistas de fofocas sobre Hollywood, da imprensa toda. O que o Edgar Morin chama de star system, as condições que transformam os atores em seres fabulosos, imortais, de certa forma. Uh, teoria. (definitivamente ando com saudades da vida acadêmica).
Mas esses malabarismos teóricos são para os críticos todos. Eles importam nada quando o Gene Kelly aparece na cena clássica da música que dá nome ao filme. Eu vi três vezes. Sorrindo.
E agora estou tão feliz que se começasse a chover eu sairia na rua, singin' in the rain.
E ganharia o troféu de ridícula do século, obviamente.

P.S.:Como eu sei sobre O Cantor de Jazz? Livro ótimo de se ler: Vocês ainda não ouviram nada: a barulhenta história do cinema mudo.
E eu sei que não sou nada novidadeira, falando de um filme que todo mundo conhece. Sorte a minha não ser paga para escrever essas coisas.

sexta-feira, dezembro 15, 2006

drive me crazy

Minha mãe está absurdamente contente porque comprou um carro grande e azul. Eu não ligo a mínima para carros grandes e azuis. Eu não ligo a mínima para carro nenhum.
Oh, que blasé. Não, nada disso. Eu sou a pior motorista do mundo. Pareço a Cameron Diaz fazendo o exame de auto-escola, nas Panteras.
Mas tem um carro que chama Picasso. Aí eu gosto, por causa do nome. Penso que deveria ter um Toulouse-Lautrec. Van Gogh. Mondrian.
Também há um chamado Clio, a musa da história. Objeto do desejo meu e dos meus amigos de curso na época da faculdade. Até a gente se formar, todos sem saber dirigir ou dirigindo muito mal (meu caso), e perceber que nosso salário paga mal-e-mal a passagem do ônibus. Há-há.
De qualquer forma, seria divertido se tivéssemos carros temáticos. Poderia haver até uma oferta maior, de acordo com as influências de cada um. Historiadores marxistas poderiam ter um Karl Marx - top de linha - ou um Caio Prado Júnior. Para os que se identificaram com a história cultural, um Roger Chartier. Os que estudam gênero ficariam satisfeitos com um Joan Scott (grande aceitação entre o público feminino). Os pensadores da teoria da história seriam proprietários felizes de um Walter Benjamim. E assim por diante. Extensivo a todas as outras categorias profissionais.
Quanta conversa fiada. C'est suffit.
A grande verdade é que sou uma andarilha. Ah, la flânerie. Se bem que o sol do Saara que faz por essas plagas transforma o poético em irritante em questão de segundos.
E começo a me convencer que devo voltar ao mundo acadêmico, a ver se meu cérebro se ocupa com coisas mais profundas.

quinta-feira, dezembro 14, 2006

ajudante de papai noel

Oh, espírito natalino que me sufoca. Hoje de manhã, os Correios invadiram a escola. Campanha Adote uma criança. Atenda ao pedido de uma delas em sua carta ao bom velhinho. Faça um pequeno feliz.
Não, obrigada. Não gosto de fazer nada por pena, ou para acalmar minha consciência burguesa pesada. Nem um pouco envolvida no clima de paz e fraternidade dos dias que correm, eu sei.
Escrevo essas coisas em um café onde um casal fala desimportâncias: chuva, compras, quarto das crianças. A conversa não tem o tom aborrecido de quem diz isso ligado no automático. E é tão bonito. Porque me entristece quando vejo aqueles relacionamentos que atingiram uma estabilidade confortável, cômoda, e parecem se contentar em não ser nada mais. Ou não se contentam e reclamam e persistem porque no-fim-das-contas-é-tudo-a-mesma-coisa. O casal aqui do lado reitera minha crença de que o amor é mais que isso. Resiste a isso.
Oh, um surto de romantismo! Eu assisto muita comédia romântica.
Mas não vou aqui me pôr sentimental. Que façam isso os poetas.
E o dinheiro que não serviu para fazer uma criança feliz alegrou a mim. Lindas sandálias novas.
Eu sou mesmo uma burguesa com a consciência pesada. Que não adotou uma criança. Que tem um novo par de sandálias. E que acredita no maior amor do mundo.

terça-feira, dezembro 12, 2006

ode a chico buarque

Como o Chico não apareceu ainda?
Postei uma parte de O circo místico lá embaixo, c'est vrai, mas nenhum texto. Um despropósito.
Ah, sim, o lugar-comum. Entende a alma feminina.
Mas além disso:
1. Ele é lindo e pronto.
2. O Chico é cool. Usa malha de cashemere azul degradê com um bom corte de calça, mas não tão estruturado quanto o de alfaiataria. Muito cool.
3. Ele é discreto. Todas as mulheres querem dar pra ele e parece que ele não come ninguém. Salvo quando a Caras consegue fotos e estampa na capa.
4. Ele começa a contar histórias, morre de rir e mal chega até o final. E é tão lindo quando ele morre de rir.
5. Sobre o álbum Chico canta. Parte de um grande projeto sobre Calabar, de cunho político, na época do regime militar. Livro, peça de teatro, disco. O livro saiu, a peça foi vetada, e o disco, que originalmente se chamava Chico canta Calabar, teve a última palavra suprimida pela censura. E ele sai com essa: Ficou uma coisa esquisitíssima, Chico canta. Óbvio, é um cantor.
6. Foi vaiado por uma platéia ensandecida no Festival da Música Popular Brasileira de 1968, quando concorria com Sabiá, parceria com Tom Jobim. Mesmo assim, não perdeu a compostura e ficou firme lá na frente. Um ano antes, na mesma situação, Sérgio Ricardo quebrou o violão e jogou no público. Ok, é atitude, mas não é nada fino. O Chico é fino.
7. "Apenas seguirei como encantado ao lado teu". Sem comentários.
8. É filho do Sérgio Buarque de Holanda, historiador importantíssimo.
9. Dança meio tímido no palco, e é uma graça.
10. Ele canta sorrindo e vale cada centavo investido para vê-lo fazer isso de perto.

domingo, dezembro 10, 2006

havana meu amor

Ontem assisti, de novo, Buena Vista Social Club. Lindo, lindo, lindo. As músicas, os velhinhos e suas histórias, tudo é bom, tudo é tocante.
Não há como não se impressionar com a Havana retratada ali. Construções quase em ruínas remetem a um passado não necessariamente grandioso, mas um pouco mais rico. Nas ruas, carros que chegaram lá nos anos 50. Parados ou em movimento, dão a impressão de que sua principal finalidade é fazer lembrar um outro tempo.
E por mais pobre e triste que seja agora, olho para Cuba com uma dose grande de carinho. Se foi palco da Revolução que começou toda certa, que fez acreditar que a utopia poderia ser verdade. Crença que, mesmo amarelada, paira sobre Havana. Nos cartazes com a foto do Che espalhados por todo lado, na placa gasta dizendo que a Revolução é eterna, no letreiro gigante com o nome do Marx.
Mas eu sei, isso é visão romântica de turista que não tem idéia do que é viver os problemas todos da ilha da resistência. Visão de comunista de boutique, como diz meu amigo.
Só os cubanos podem falar da Revolução e seus limites. Como faz Ibrahim Ferrer, um dos músicos do Buena Vista: "Se tivéssemos seguido o caminho material, teríamos desaparecido. Nós, cubanos, temos muita sorte. Nesse aspecto, somos pequenos, mas somos muito fortes. Soubemos resistir ao bem e ao mal."
O que mais se pode dizer?

sábado, dezembro 09, 2006

always look on the bright side of life

É o conselho musical que Brian ouve do homem na cruz ao lado da sua. Depois de ter sido crucificado, quase ter sido solto ( um quase, nessas circunstâncias!), receber, pendurado na cruz, uma bronca da mãe, uma menção honrosa dos camaradas, a admiração comovida da namorada e a visita do esquadrão suicida. E ninguém o tirou de lá.
A vida de Brian. A história do menino da manjedoura ao lado. Eu acho uma ótima alternativa para assistir no famigerado 25, enquanto na tv estiver passando, como todo ano, aqueles filmes bíblicos longos, chatérrimos e dublados. Ou aqueles especiais com os grandes da Globo e um monte de crianças, loiras, negras, japonesas, somos-todos-iguais-e-queremos-a-paz-mundial.
O comentário curioso do dia: você nunca fica triste.
Ah, fico. Como todo mundo. Por coisas bobas e por coisas grandes. Bobas como acordar de manhã, se olhar no espelho e se achar horrível. De verdade, não como aquelas supermodelos que, não sei por que cargas d'água, cismam em fingir que são como o resto dos mortais, e sempre falam nas entrevistas que têm dias que não gostam da aparência. Ahã.
Coisas grandes como todas as coisas grandes, as tristezas, os problemas. Que apertam o peito e sufocam e parece que nunca vai passar.
Mas eu sempre penso que tristeza é bom pra quem faz música ou poesia. Eu gosto da alegria frívola das amenidades.

sexta-feira, dezembro 08, 2006

formando cidadãos

"Papai eu quero me casar
Oi minha filha você diga com quem
Eu quero me casar com Ney Matogrosso
Ney Matogrosso, aí 'cê casa bem
Por quê, papai?
Ney Matogrosso vira homem e lobisomem
E quando é homem não faz medo pra ninguém".

Ensinando para os alunos as musiquinhas dos Trapalhões.

quinta-feira, dezembro 07, 2006

colibri

Incrível como coisas pequenas deixam o dia delicado.
Hoje fui trabalhar algo menos contente que o habitual, talvez um pouco exausta de tanto corrigir provas, levar bronca da chefe, essas coisas.
Mas aí eu vi um beija-flor. Nenhuma comoção daquela dos cartões que têm a foto do passarinho e uma frase edificante. Lembrei de O circo místico, que fala em colibri e, na mesma hora, de uma amiga que gostou da música porque na época fazia teatro e aprendia acrobacias.
E é tão impressionante, vêm junto outras mil recordações. Não falo aqui do saudosismo deprimente eu-era-feliz-e-não-sabia. Esse me dá calafrios. O que acho bonito é poder me perceber nas minhas histórias, nas minhas marcas.
Penso que isso é parte do invisível cordão de que fala a música. Que de tão linda merece estar aqui.

Não
Não sei se é um truque banal
Se um invisível cordão
Sustenta a vida real
Cordas de uma orquestra
Sombras de um artista
Palcos de um planeta
E as dançarinas no grande final
Chove tanta flor
Que, sem refletir
Um ardoroso expectador
Vira colibri

quarta-feira, dezembro 06, 2006

as time goes by

Em um dos curtas de Sobre café e cigarros, do Jim Jarmush, um dos personagens afirmava que Elvis não morreu. Defendia a tese de que seu irmão gêmeo não nasceu morto, como se conta por aí. Esse outro teria tomado o lugar do rei do rock'n'roll e vivido boa parte de suas histórias. E que no fim das contas quem morreu foi o usurpador.
Hoje me lembrei disso porque topei, pela terceira vez, com um comandante da Marinha que é a cara do Humphrey Bogart.
Na primeira aparição, ele foi fazer palestra em uma das escolas onde trabalho. Enquanto se ocupava em explicar os diferentes tipos de embarcações, o significado dos uniformes, o que são as fronteiras líquidas, blá,blá,blá, eu me divertia imaginando o dono do Rick's Bar comandando operações dentro de um submarino, copo de uísque em uma mão, cigarro na outra.
Tempos depois viajamos no mesmo ônibus e, céus, semelhança impressionante.
Hoje ele voltou ao colégio para entregar um prêmio a uma aluna.
E não há mais dúvidas. Humphrey Bogart não morreu. Depois de ter um bar em Casablanca, descobrir o paradeiro do Falcão Maltês, elucidar o assassinato do marido de Lizabeth Scott, casar com Lauren Bacall, entre outras peripécias, agora compõe o quadro dos bravos defensores das águas tupiniquins.
Até pensei em contar a ele, mas sei que o deixaria constrangido. Me contentei com uma piscadela, que dizia: ok, Bogart, seu segredo está a salvo comigo.

terça-feira, dezembro 05, 2006

riobaldo taturana

Interior way of life.
Eu e meu inglês maluco. Sei tanto do idioma bretão quanto sei tocar harpa.
Mas o interior. Às vezes é Itabira do Drummond, às vezes é Nonada do Guimarães Rosa. Ou não é nem um, nem outro.
Mas hoje ainda não acabou e já foi um pouco dos dois. Logo cedo fiquei sabendo de um matador profissional que veio fugido do Mato Grosso. Ameaçou mulher e filho. Com faca. Foi como contou uma professora, que ouviu da mulher do irmão do facínora.
Com essa história na cabeça fui ao microsupermercado único da cidade, e a rádio local anunciava a previsão dos signos para 05 de dezembro.
Gêmeos: hoje é um bom dia para usar vermelho.
Os astros devem estar loucos. Se o dia se faz cinza depois de semanas amargando o sol inclemente dos trópicos. Nenhum geminiano em sã consciência ousaria ofender o resto do zodíaco com a lembrança da quentura absurda, todos tão aliviados com a trégua que, se sabe, será mais curta do que deveria.
E enquanto eu pensava essas inutilidades, uma não-geminiana vestia azul e ia em câmera lenta pela rua vazia.
Ver o mundo em slow motion. Coisas do interior.
Ah, oui, sou de gêmeos. Não me lembro de ter qualquer peça vermelha no guarda-roupa. E minha paciência é pouquíssima quando se trata do papo-signo.

upload: graças à intervenção do Cláudio, grande leitor de Guimarães Rosa, venho aqui corrigir o nome do post. É Riobaldo Tatarana.
Gracias, friend.

segunda-feira, dezembro 04, 2006

reminiscências

Quando eu era adolescente - e o que eu vou dizer agora não é nenhum motivo de orgulho - ouvia Engenheiros do Hawaii. O tempo todo. Para as crises, as angústias, os amores, o-brado-juvenil-contra-a-ordem-estabelecida. Minha irmã, que é a adolescente mais legal do mundo, ouve Beatles, New Order, Strokes e outras coisas bem boas, e diz que morre de pena da minha pobreza musical em tempos idos. Com toda a razão.
Anyway. Hoje, por uma dessas incríveis operações mentais - e sim, continuo com vergonha de escrever isso - me veio Infinita Highway na cabeça.
Minha vida é tão confusa quanto a América Central. Que ridículo. Eu não fazia a menor idéia do que se passava na América Central. Mas minha vida é tão confusa agora, fim-de-ano-em-três-empregos. O que significa pilhas de provas de três lugares pra corrigir, cada um com quatro, cinco salas , vinte ou trinta pessoas em cada sala. Os doze trabalhos de Hércules, separar isso daquilo, dar notas, fugir dos alunos que me perseguem pelos corredores.
É sempre a mesma história, e cada fechamento de bimestre que se aproxima me prometo que vou fazer tudo antecipadamente, cartesianamente.
Agora me arrependo roendo as unhas.
Ok, muito infame. Bom humor súbito frente as montanhas que tenho que escalar.
Vou lá, então, concentrar-me no trabalho, antes que comece a cantarolar Pra ser Sincero.
Socuerro.

domingo, dezembro 03, 2006

teenage fanclub

Ninguém gosta de adolescentes. Muitos dos meus amigos adultos como eu não gostam. Porque amam demais, sofrem demais, são indecisos demais, estão gordos (ou magros) demais e têm espinhas demais.
Convivo com dúzias deles, todos os dias. And I love it. Porque, na verdade, o que passa é que vivem demais. Vivem tudo estourado. Ainda não aprenderam a contrição abençoada, o comedimento choose-a-life-choose-a-job-choose-a-career-choose-a-family. Bueno, caminham em direção a isso, mas enquanto não chega.
Enquanto não chega, ser feliz é a única possibilidade. Lust for life, como canta o Iggy Pop.
Hoje foi uma dessas despedidas dos que terminaram o ensino médio. Eu, como sempre, a única professora participando. E acreditando, como eles, que hoje é um bom dia para ser feliz.

sábado, dezembro 02, 2006

put the blame on mame, boys

O nome?
Para os que me conhecem, nenhum lampejo de criatividade.
Ah, cinema clássico. Uma hora e meia, duas, de mundos onde homens cometem crimes por mulheres lindas e perigosas, problemas se esquecem dançando, mocinhas lacrimejantes só sorriem no The End. O finíssimo preto e branco, o absurdo technicolor.
Me encanta, me fascina, e eu posso rever esses filmes incontáveis vezes, feliz. E poderia passar horas escrevendo sobre eles.
Tudo começou com Gilda. A primeira aparição da Rita no filme me deixou marcas indeléveis. Depois vieram os musicais em que ela dança com Fred Astaire. E A dama de Shangai, junto com a lenda de que o Orson Welles obrigou-a a cortar a cabeleira ruiva de propósito, uma coisa meio psycho husband. Fofocas de Hollywood. E o maior desaforo de todos, ela ouviu do Frank Sinatra em Meus dois carinhos: Se você soubesse o que perdeu, se mataria.
E nem assim perdeu a classe.
E não, nem era tão boa atriz e fez quinze mil plásticas pra ficar daquele jeito. Pouco importa. No mundo de Rita Hayworth, basta ter um olhar penetrante, tirar uma luva ou jogar o cabelo para que as coisas se resolvam. Não acho ruim trocar o meu por esse, às vezes.

pra não dizer que eu não tive um blog

Por que eu nunca tive um?
Basicamente, porque não tenho nada de fundamental pra dizer sobre coisa alguma.
E por que isso, agora?
Porque às vezes tenho vontade de escrever sobre as pequenas coisas ridículas, mesmo que ninguém leia.
Porque eu gosto das palavras.
Porque os amigos de perto não têm paciência infinita pra minha conversa fiada.
Porque os amigos de longe perguntam da minha vida.
Porque algumas coisas ficam bonitas quando escritas.
E porque bem agora eu não tenho mais nada pra fazer.